sexta-feira, 28 de janeiro de 2011


MARINA E OS MÓBILES MARINA E OS MÓBILES

Quando aguardávamos a chegada de nossa filha Marina, pensamos em criar ou comprar móbiles para pendurar em seu berço, em seu carrinho de passeio, sobre os tapetes que forraríamos no chão da sala - onde ensaiaria seus primeiros “engatinhares”- ou no quadrado onde iniciaria seus primeiros “levantes”.

Vimos alguns modelos em revistas, ouvimos muitas sugestões de parentes e vendedoras de produtos para recém nascidos, mas na verdade não chegamos a nos interessar por nenhum. Ganhamos um numa promoção de uma loja, mas não foi muito do agrado da nossa “Capocha”.

Foi impressionante notar desde os primeiros momentos com ela, como seu olhar é atento a tudo ao seu redor. Unindo-se aos seus olhos embaciados, inseguros e enevoados, próprios de quem acaba de chegar num lugar desconhecido, os primeiros móbiles de Marina foram nossos rostos risonhos. A estes se seguiram outros como, por exemplo, na banheira, a água que descia das nossas mãos em direção ao seu corpo diminuto.

As tramas e dobras do mosquiteiro, os cabides com suas roupinhas penduradas no guarda roupas, o leve balançar da cortina na janela do seu quarto, quando a luz do sol incidia sobre ela e junto com a brisa, formava figuras abstratas em movimentos compassados e sinuosos, eram atentamente acompanhados por seu olhar.

Partindo daí, em seus primeiros passeios começamos a perceber como a tudo prestava uma dedicada atenção, esticando o pescoço ou a cabeça para um lado ou para o outro, muitas vezes nos levando a parar para ver qual detalhe do caminho tinha nos passado despercebido. E lá estava uma luz a piscar num poste esquecido na iluminação da rua, uma folhagem no jardim de sua avó a balançar ao vento, o ranger, o serpentear e o flap flap de uma vela de jangada, nosso reflexo nas vidraças dos carros, palhas de um coqueiro anão, ventiladores girando no teto da padaria, o fechar e abrir da porta do quarto, o sobe e desce agitado das catengas num muro velho e sem reboco, motos e seus barulhos rasgados, carros que passam por nós e até os sininhos dos vendedores de picolés... Nada escapa aos olhos e depois aos ouvidos de Marina. Quando ando com ela nos meus braços pelas ruas do bairro, não passa uma pessoa que ela não queira acompanhar. Ri pra todo mundo, gira a cabeça e depois o resto do corpo, só faltando descer do meu colo para sair atrás do povo. Nas lojas deslumbra-se com a disposição e cores dos produtos expostos nas gôndolas e quiosques espalhados à nossa passagem.

E foi justamente numa ocasião, quando saímos para comprar-lhe um desses brinquedos, que percebemos: para ela o mundo inteiro é um grande e magnífico móbile. Sorve-o com doçura e avidez desde que abre os olhos pela manhã e dá de cara com nossos rostos risonhos levitando em torno de sua face, chamando-a para mais um dia de aprendizagem, crescimento e equilíbrio, nos finos fios que nos atam ao misterioso, aventureiro e venturoso viver.

Os móbiles das lojas ficaram pra depois ou, quem sabe, pra nunca mais...



 

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